quarta-feira, 23 de março de 2011

Que foi filho? - perguntou a mãe astuta.

    - Nada não. - respondeu com a voz seca, sem vida.
    - Nada não? Você está com a voz seca, sem vida...      
    - Como? Não! Estou bem...
    - O que está fazendo aí nesse computador?
    - Nada de mais... msn...
    - Sei... esse negócio onde as crianças são estupradas por tarados internautas que enganam elas fazendo-as acreditar que ele é amigo?
    - Isso mesmo... mas um pouco mais seguro. Aqui eu posso escolher se eu add o tarado ou não. - disse, sempre com apenas a resposta na língua e nenhum brilho a mais.
    - Add?
    - Adicionar.
    - Hun...
   Perdurou-se alguns minutos em silêncio. A mãe a olhar seu filho, o filho a olhar seu amigo eletrônico.
 - Seu pai está demorando.
   Assim que notou a falta do homem da casa, ouviu-se a buzina da moto dele a avisar de sua chegada. Um sorriso se abriu no rosto cansado da trabalhadora doméstica e os olhos do garoto se perderam por não mais do que um instante antes de voltarem atentos para o computador.

 - Oi filhão!
 - Oi pai...
 - Que foi rapaz?
 - Nada não...
 - Que foi com ele, amor?
 - Ficou aí nesse computador, no tal do msn, na internet. Não fez nada hoje além de ficar aí...
 - Vai filhão! Me diz que se passa nessa sua cabeça adolescente! Se não falar não come sonho! Ó, que delícia que eu trouxe!
 - Não quero pai, obrigado...

    Mais uma vez aqueles minutos traziam um buraco-negro no diálogo da família. Os pais sabiam o quanto era perturbada aquela fase. Oras, o rapaz só tinha 18 ano. Sabiam que esta era uma época de difíceis decisões e...
    - Tá doendo...
    - O que meu filho? - arregalou os olhos a mãe preocupada.
    - Acho que eu já sei o que dói. Deve ser a cabeça, de tanto ficar aí na frente dessa tela fria. - disse o pai com voz firme, já começando a se irritar com a palidez inexplicável do filho.
    - É a cabeça filho?
    - Também... mãe, eu não tô a fim de conversar agora, tá?

     O silêncio se tornou pesado, denso. Nunca o filho levantara a voz para a mãe, ainda mais na presença do pai, que não costumava tolerar falta de educação e respeito, principalmente dentro da família.
    - Deixa eu ver o que você tá vendo aí nesse computador. Aposto que é ele que está fazendo você ficar estranho desse jeito. - enraiveceu o pai, indo em direção ao computador, tirando ele das mãos do filho.
    Dessa vez o silêncio acabara por preocupar a mãe, desesperar o filho e calar o pai.
    - Desculpa filho... Mas... não fique chateado. Essas coisas acontecem e... é melhor você deixar isso para amanhã, quando estiver de cabeça fria.
    - O quê você viu aí meu amor? - perguntou a mãe.
    - Vi que nosso filho esta mais forte do que imaginávamos. Vi que nosso filho já cresceu e agora, mais do que nunca, está aprendendo a ser homem... - respondeu firme o pai orgulhoso, olhando fixamente para os olhos de sua esposa e terminando a fala com os olhos sob o filho, antes de partir para o interior da casa.
    - Filho?
    - Vai ficar tudo bem mãe...
    - Deixe-me ver...
    No computador do jovem estava aberta uma janela...


  

domingo, 20 de março de 2011

Semana do Teatro de 22 a 27 de março

Retirado do blog "Mercado Cênico".



    A Câmara Setorial de Teatro de Campo Grande e Federação Sul-Mato-Grossense de Teatro (Fesmat), em parceria com a FUNDAC E FCMS promove de 22 (terça-feira) à 27/3 (domingo) a Semana de Teatro, evento em comemoração ao Dia Mundial do Teatro e Dia Nacional do Circo (27 de março).

    O evento acontece no Teatro de Arena do Horto, e conta com várias apresentações teatrais para todos os públicos. Na abertura da Semana do Teatro (dia 22 às 19h) será apresentada à peça “Incontornáveis – Um teatro de incoerência e horror”, do grupo Mercado Cênico. Voltada para o público adulto.

    No dia 23 (quarta-feira) às 15 horas, acontece a peça “Sob Controle” (Livre) do grupo Flor e Espinho, e às 20h, a peça “Arte de Quinta”(Adulto) do Grupo Adote.

    Na quinta-feira (24) duas peças serão encenadas no Teatro de Arena: 09h, ”El Magnifíco Duelo” (Livre), do grupo Desnudos Del Nombre; 15h “Tekoha-Ritual de vida e morte do deus pequeno” (Adulto), do Teatro Imaginário Maracangalha, e a partir das 19h, o Lançamento do Livro “Vozes do Teatro”, no Memorial da Cultura.

    Sexta-feira (25), às 9h, “O Rei que Não Sabia Rir” (Grupo Identidade Teatral), e 15h, “O Sapo Encantado e outras histórias” (Grupo Teatral Unicórnio), são as apresentações Infantis. Para os adultos, às 20h,“Não é Festa de Criança!” Com Juan e Thibau.

    Cincos peças fecham a Semana do Teatro. Sábado, 10h30 , “O Arco-Íris” (Grupo Prisma); 15h, “De palhaço e Lobo Todo Mundo tem um Pouco” (Grupo Arte Riso) e 20h, “Os Corcundas” (Circo do Mato). Livre para todos os públicos. Domingo, Às 15h, a peça infantil, “A Princesa Engasgada”(Teatral Grupo de Risco), e às 20h, o espetáculo adulto “Socorro Minha Casa é uma Comédia” (Grupo Palco) encerram a semana de comemoração.

quarta-feira, 16 de março de 2011

1% pra cultura, Lei é Lei rapaziada!!!

Lei é Lei 1% pra Cultura.

    Pessoal na próxima Terça Feira 22/03, 09:00 da manhã o Colegiado Setorial de Teatro de Campo Grande fará um pronunciamento na câmara municipal buscado sensibilizar os vereadores, para importância da implementação Plano Municipal de Cultura em nossa cidade, aprovado em 2009 e que garante 1% do orçamento municip...al para a Cultura. O plano não está sendo cumprido e é um assunto de interesse púbico por isso pediremos uma audiência Pública para debatermos amplamente este assunto. 

    O colegiado pretende realizar movimento por mês até a votação do orçamento em Dezembro, ou seja, temos o ano todo pra nos articularmos. 
    Convidamos todos os artistas e pessoas interessadas neste assunto para estarmos junto, pois essa luta não pode ser isolada. Terça Feira 22/03, 09:00 da manhã na Câmara Municipal de Campo Grande, vamos juntos!





segunda-feira, 14 de março de 2011

E pra quê serve a poesia ?

   E pra quê serve a poesia? Eu de tanto saber não sabia nada sobre ela. Ela mesmo? Difusa, elétrica, plástica, a poesia dissolvida em todos os nomes. Mas heim? A poesia não serve para nada mesmo? Asas nas mãos, a poesia serve ou é para ser servida? Senão vejamos: talvez esteja ausente, nunca tenha sido ou ainda tenha sido exposta n´O Banquete. Serve para se estudar um campo histórico, a subjetividade ou ainda a materialidade de um tempo, serve para ser arquitetura e poiésis, construção, como analogia do mundo, homologia do caos, serve para antecipar o ser em seu devir, ou ainda questionar a linguagem a respeito de seus limites, serve para ferir a razão em suas certezas e para agravar os problemas lógicos do sentido, serve em sua recepção para saber que das restrições ao seu acesso é exposta uma divisão social, uma desigualdade. Serve para explorar os limites de uma língua, como em Homero, Dante, Shakespeare, Camões, que mudaram suas línguas de origem e introduziram formas antes desconhecidas no pensar. Poesia serve para ser pensamento, rigor, produção de conceitos. Serve também para dizer que um texto tem muitas vozes e que os agenciamentos polifônicos questionam o estatuto do autor, de autoria, de identidade, fronteira. Poesia escondida no vaticano serve para nos dizer do poder e de como o poder teme ser impotente diante do poema. Poesia guardada por governos autoritários serve para nos dizer o quanto um livro pode incendiar a ordem. Poesia serve para alimentar paixões revolucionárias, nutrir pacifistas e encaminhar passeatas (serve também para ser distribuída em passeatas). Poesia serve como inutencílio, como em Manoel de Barros, e mostra o quanto o que achamos grandioso beira o medíocre e o rasteiro. Poesia serve para não ser metafísico, mas também para sê-lo, se assim se quiser. A poesia serviu para Heidegger ir à Floresta Negra e declinar o nazismo, e serviu também para dizer a Lukacs na análise da estrutura social que seu marxismo poderia ser aprofundado. Mas poesia serve também para roçar a nuca do estruturalismo, ou ainda dizer que o cartesianismo é um bicho-de-pé que resiste aqui nos trópicos, e que o positivismo é um recalque que vira decalque na bandeira. Serve também para criar tantas formas que ultrapassam as categorias aristotélicas da arte definidas na Poética., e diz assim que a Poética faz parte de um sistema aristotélico ligado aos outros livros sobre a política e a filosofia, e que Aristóteles assim delimitado, serve para a poesia pensar o quanto as categorias aristotélicas estão limitada e limitam a reflexão sobre o mundo e sobre as próprias categorias. A poesia serve também para sacar que o aristotelismo está mais vivo do que nunca nas ciências. Serve também como conspiração, abandono, experiência, engajamento, intensificação de si, exploração de possibilidades cerebrais, cognitivas, serve para medir o grau de entrega à abstração que um leitor se permite. Poesia serve para saber que se uma sociedade não sabe da poesia ela está apenas engatinhando para o humano, ou serve para vermos o quanto uma sociedade se torna tão utilitarista e reificada que tem que perguntar: para quê serve a poesia? E serve também para sabermos que teremos que responder “para que serve a poesia” porque os banqueiros são os faróis modelares das gentes, os índices atrativos de um perfil de indivíduo afoito pelo “sucesso” e que, assim, o poema inscrevendo outros desejos, outras imagens, outros humanos e outras terras, pode dizer que o banqueiro quer o lucro pelo lucro, que o empregado quer ser banqueiro e de que para tanto nada do que for supérfluo, e que não possa virar mercadoria, merece atenção. Poesia, neste sentido, não serve para nada mesmo. Nada que se transforme em mercadoria, e para saber que isso incomoda (nunca vi um poeta ficar rico com poesia). No Brasil, para segurar a onda os poetas se tornaram jornalistas, e o resultado mostra que a poesia serve para ser um impulso para melhorar o jornalismo em sua cultura, rigor, trato da língua e reflexão. Ninguém fica melhor com poesia, mas nada garante que uma sociedade sem poesia, como queria Platão na República, seja melhor e mais pura, não “infectada” por artistas que se permitem tanto e são tão permissivos, tão libertinos e libertários que um dia bem podem até ser capazes de “corromper a juventude ateniense”, de estudar, criar organizações e tomar o poder e a lógica de governos antes considerados inabaláveis. Poesia também denuncia a lógica dos perebas. Aponta a ponta do nariz da chefia tonta e caduca por um triz. Poesia serve para brigar na Universidade para que se tenha poesia. Poesia serve também para ironizar o poder, para estudar o poder, serve para muita gente se esconder, para muita gente se achar, e para a maioria se perder. Poesia serve para pregar na parede, serve até para o ato mórbido de cultuar alguém pregado na cruz, serve para falar quando se está bêbado, serva para casamento e também para separação, para a multidão e par ao solitário, para o condenado saber que a vida até ali valeu a pena. Serve para sintetizar um pensamento longo ou para alongar um sentido antes único de uma palavra. Serve para enfrentar a morte, para não morrer, e deve servir para eu ficar escrevendo toda tarde sobre ela, apaixonado, sem nunca acabar. Poesia também serve para pensar o que somos mas, mais ainda, para explorar o que não somos, visto que o poema nunca mostra que é, mas o que poderia ser. É potência e não passado. Torna conhecido o novo e desconhecido o velho, inscreve um rastro na memória, repõe os monólitos em nossa frente para que possamos visualizar bem de perto os monstros que nos reinventam, esvoaçam os monólitos com respirações pausadas. Poesia também serve para ser lida secretamente, para o silêncio, o segredo, o balbucio, para ouvir o alarido infindável das coisas. Serve para que repousemos as coisas de seus nomes e serve para questiona nossos próprios nomes. Sendo secreta, a poesia serve para molhar o sonho das tias carolas, para estimular a dúvida das freiras, para rasurar a filosofia dos sacerdotes e para notar o quanto estão libertos (ou não) do peso que para si constroem na existência. A poesia serve para arranjar namorada, para mentir com aprovação estética, para editar livros e, pasmem, gerar empregos. Também serve para irritar burocratas, ironizar chefias, cometer atos ilícitos e fazer provocação ao controle. A poesia serve para descobrir a sexualidade, para arrancar do mundo seu contrário, para ser o atrito e buscar uma ausência, sempre presente em tudo. A poesia serve para se colocar em risco e, assim, para ultrapassar as condições dadas, serve para ampliar os limites do mundo já que a linguagem com que falo o mundo tem seus limites. Serve também para variar as 300 palavras que circulam cotidianamente nos jornais e crer que o pensamento pode mais se a língua se alarga. A poesia serve também para produzir um livro em que está escrito: “tudo na França é falso e desprezível”, e que o governo francês, identificando a frase como sendo do ícone nacional Rimbaud, tivesse que pagar cinco mil francos para adquirir e esconder a obra. A poesia serve também para entender melhor meu cachorro, para aprofundar amizades, para ser coletivo espraiando-se no mundo sem peias na língua ou mesmo nos pensamentos. A poesia serve mais para aprender a morrer do que para aprender a viver, para chorar mais, gargalhar bem melhor, para grunir, coachar, relinchar, uivar, grasnar, mugir. Poesia serve para ruminar e serve para se ter um espanto no cotidiano mais pueril. Poesia serve para se masturbar, para ler em gente ao mar, para conhecer aquele poeta que invento em minha voz. Serve também par o teatro, para a máscara, para a persona, serve para a música, para “acordar a cidade ou embalar o sono da criança” (Drummond). Poesia serve para permanecer sempre revoltado com o estado de coisas, serve para decidir sobre uma ética, um desejo, e serve para produzir textos sobre poesia numa universidade sem poesia, e serve para dar aula até onze da noite e depois achar muito bom comer pão com ovo ou “churrasquinho de gato”. Poesia serve para o poema, para o estratagema, para a cena, para Madalena ou Helena. Serve para conhecer a idealidade dos gregos e para rir junto com os latinos, serve para reinventar costumes, opiniões, índices de liberdade q que se permitam os estados subjetivos. Serve para qualquer viagem, serve par pensar o epicurismo em sue único documento existente hoje: um poema de Lucrécio: “De natura rerum”, serve para estudarmos de que modo o homem pensava a cosmografia universal da metafísica cristã, na Divina Comédia, serve para que Diderot afirmasse: “poesia é uma forma de conhecimento”. Serviu para Nietzsche compor o Zarathustra, para Freud criar a teoria do sujeito e estudar o inconsciente, para Jung estudar os símbolos, serviu para o jovem Marx pensar a divisão de classes a partir da épica burguesa: o romance, e para Walter Benjamim falar sobre a modernidade, a partir de Baudelaire. A poesia seve para criar o termo “modernidade” (Baudelaire) e para um grupo de jovens irreverentes organizar uma semana que mudaria a História do Brasil em seu debate sobre a identidade, nacionalidade, política, cultura, atraso, arte, desenvolvimento, etc. Serve para quem empilha versilho em agenda dizer que é poeta, ou para raros poetas se esconderem em bares imundos, e gerarem filhos estrangeiros em sua terra natal. Poesia serve para encarar busão da Motta, para não precisar de terapia ou de deus, para não pensar em nada quando dói muito, para se pensar em tudo quando o corpo se dissolve na história. Poesia serve para a memória ou para o esquecimento em igual proporção. Poesia serve para ser sempre desconfiado e é uma putinha que rebola em sua frente e não te dá nunca.


 Autoria de Daniel Abrão, professor do Curso de Letras da UEMS em Campo Grande - MS.